
28.1.08
21.7.07
Murmuro ao Ouvido
venero-te...
Desde o início. Desde o primeiro dia. Quão ridículo soa este mumúrio?
30.6.07
Sinceridades
Tenho dito que o destino me grita ao ouvido, mas eu tremo de medo. É de ti que tenho medo. Ver-te faz-me subir a um lugar que desconheço e onde não tenho vertigens, mas quando a minha mente trabalha à noite eu desço à terra e a razão abre-me os olhos. Tenho medo de ti, de te ver desaparecer. Tenho medo de ti, de que me recuses. É só de ti que tenho medo.
Decorei-te os passos, cada gesto teu, a forma como colocas os pés no teu andar. Baixas a cabeça, tímido, abre os olhos. O casaco sobre o ombro direito, que aconchegas sempre que estou por perto. As mãos nos bolsos, o sorriso escasso... Tomara arracar-te um um dia destes. Um sorriso, desses que reservas para poucos, que irradiam mais mistério e entusiasmo do que aqueles que me despertas.
Sempre sozinho, sempre contigo, revelas-te pouco. Não sei se queres ser discreto, se tens medo dos outros, se te sentes pequeno. És algo raro, meio deslocado do nosso mundo. E estás tão perto de mim... tão perto que já te senti o perfume, a respiração, já me sussurraste em silêncio...
Dizem-me que sim, que sonho alto, alto e bem. Que tu estás mudo de vergonha de me encarar. Que me queres revelar-te, mas que és um totó (literalmente) que nunca há de lutar por si. E não sei. Não sei mesmo, mas partilho esta certeza com a incerteza. Ela diz-me para ouvir a razão. E a razão tem mais poder sobre mim do que o que me dita a emoção. Por causa do medo...
Os teus olhos procuram os meus, mas nunca se veêm. E todo tu mudaste e estás igual. Igual ao que eu quero que sejas. E quero que sejas mais meu do que qualquer outro objecto que possuo. Serei justa contigo, dar-te-ei o espaço que precisas, mas quero roubar-te o coração sem qualquer escrúpulo. Quero que me tenhas cativa no teu mundo, que penses em mim todas as noites, que sonhes comigo e me procures. Dar-te-ei o ombro, dar-te-ei a alma. Dar-te-ei tudo o que me pedires.
22.6.07
Por azar, as ruas tendem a ser torcidas e o trabalho não fica em nada facilitado – que se compreenda..
MAL-DIZERES-E-AFINS-MUITO-GROSSEIROS.
Não é fácil para alguém assim tão pequeno. O Mundo é estranhamente grande.
Entem-me, não entendem? – Espero que sim.
5.6.07
O amor é fodido
Mais uma noite em que acordo a meio de sonhos com ela. A Clarividência dorme no quarto ao lado. Fujo à cozinha e refugio-me num whisky com três pedras de gelo e um cigarro a olhar para a noite lá fora.
Miguel Esteves Cardoso diz que “o amor é fodido”. Quantas vezes pensei que este gajo tinha razão... Não sei se é amor o que me faz não conseguir dormir mas é mesmo fodido sonhar com ela e acordar sem a ver. Pergunto-me onde estará ela... Em que sonhos se perde, de mão dada com quem... Hoje está uma noite escura, nem a lua se mostra. Dizem que quando a lua não se mostra é quando está lua nova. Talvez a razão das minhas insónias seja como a lua e, se ela desaparecer de dentro de mim, então talvez eu tenha uma vida nova. Divago e trinco um cubo de gelo. Dá-me arrepios pela espinha acima, numa dor aguda que não é nada comparado com a dor desta insónia recheada de pesadelos.
É fodido ter tanto para dar e nada para receber. Um mundo inteiro de sonhos, de possibilidades, de magia que posso oferecer e esforçar-me ao máximo para não se perder. Tenho o coração em saldos. É fodido ter uma tabuleta na alma a dizer: Trespassa-se. Mas também quem quer um coração colado com fita-cola, todo partido de já ter caído tantas vezes? Quem quer uma alma triste de artista? Apregoo a ela. Sou um marroquino a vender afectos para dar. Mas ela não os quer. Ela não tem culpa. A culpa é do amor que é fodido...
Sem querer, acordei a Clarividência... Desculpa, minha amiga... Não consigo dormir. Queres falar de coisas fodidas? Vamos falar de amor ou de tudo o que se pareça com ele, ok? Ela diz-me baixinho que nada é fodido, que as coisas são como são e que Deus escreve direito por linhas tortas. Que Deus? Onde está ele? Onde está a caneta com que ele escreve? Acho que a tinta lhe falhou quando chegou à parte em que contava a minha história.
Não sejas tonto, diz-me ela. Talvez seja esse o desígnio que ele te deu, andares perdido a gritares apenas para as tuas folhas e para mim, a tua amiga imaginária.
Eu não quero folhas, não te quero a ti, não quero nada disto! Quero que alguém se preocupe comigo assim como eu me preocupo. Quero que alguém me ouça e que me diga que também gosta muito de mim. E esse alguém és tu, minha amiga, mas não é quem eu quero que seja.
A Clarividência volta para o quarto a dizer que eu estou doido. Eu sei... é um estado de doidice que me faz sentir a pior merda do mundo e basta um “bom dia” de alguém para me meter um sorriso nos lábios. É triste. É fodido...
Volto também para a minha cama. Sei que amanha vai ser o mesmo. Passar a sobreviver à espera de um olhar com mais significado. Um toque que diga que me quer ao pé dela. Uma cara que conheço de cor e que tão poucas vezes vejo. Sempre à espera, passar mil e uma noites à espera de algo que não vem...
Adormeço para mais um sonho com ela e uma certeza:
O amor é fodido...

4.6.07
Homem invisivel
Sentei-me num banco da avenida,
a observar esta cidade que se diz evoluída.
Vejo a sociedade que, a tentar sobreviver,
já perdeu, há muito, a capacidade de ver...
Caminham todos, na pressa dos seus afazeres.
Caminha tu como eles para veres
como os Homens já não sabem parar para olhar
Apenas passam a vida a caminhar...
E, no meio desta multidão,
vem-me aos ouvidos uma canção...
Um pedinte está ali sentado no chão,
canta alto e estende a mão.
Todos passam e muitos nem o vêm...
Os Homens têm olhos mas parece que não os têm!
Apenas passam, passam sempre na mesma avenida...
Não vêm o homem invisível
ou chamam-lhe maluco por cantar para a vida...
Todos passam e alguns riem-se do pobre homem louco.
Outros mandam-lhe uns trocos mas é sempre muito pouco.
Mas ele canta alegre, como se fosse feito de felicidade...
Só eu vejo o homem invisível aqui, no meio da cidade.
Todos vêm o vagabundo na margem mas eu vejo-o no centro...
Todos vêm-no alegre mas eu sei que o homem invisível chora por dentro...
Opressão
No dia seguinte vejo deus encharcado de sangue e areia. Não mais é deus, é um mero animal sem raça desfeito debaixo do olhar do novo ser que o destronou e que ri à gargalhada. Não me apetece rir, mas é doce este feitiço quebrado. Tem um ligeiro aroma a vingança, mas cedo me enjoa aquele sabor. Sinto-me deslavada, a apodrecer por dentro. Aquele deus que foi e já não é obrigou-me a sentir-me bem com o espectáculo gratuito, mas não é isto que quero sentir. Dissipo-me, progressivamente, num espectro leve de matéria e pesado de culpa. Não, decidi que não vou gostar de vos ver chorar, sofrer, sangrar. Decidi que quero fechar os olhos e ser maior.
E, talvez, voar.