31.3.07

Cartas a Ti

14 de Dezembro de 2003
Ás vezes, quando nada mais há para fazer, sento-me a pensar. Tenho tempo para o fazer e não me canso. Olho em redor. Não tenho mais para onde olhar. O que vejo varia. Se a minha mente estiver confusa, tentanto misturar azeite e água numa batedeira, o que se estende à minha frente nada mais é do que algo sem nexo, sem beleza, sem entusiasmo. Se eu estiver com um júbilo evidente, tudo em meu redor se assemelha a um carnaval de vaidades. Porém, há dias em que me apetece chorar e quando olho em meu redor sinto uma vontade imensa de me sentir conforme o que vejo.
Céu azul, liberdade. Pareces um pássaro sem rumo, guiado pelas brisas matinais. Céu estrelado, grandiosidade. O mundo torna-se teu, como se tu vivesses numa redoma de vidro infinita. Céu enevoado, amargura. Se estás tu e o pálido assustador do céu, parece que o teu espaço é limitado. Parece que, se esticares um dedo, ele irá arranhar esse tecto frio e espectacular.
Mar calmo, transparente, sincero, diáfano. As águas parecem mais quentes, sem segredos, sem mistérios, mas cheios de vida e de pequenos pormenores que os teus olhos nem acreditam. Mar bravo, escuro, profundo. Misterioso, abranda e enfurece sem tu saberes porquê. Se te calares e o ouvires murmurar ficarás a saber alguns dos seus inúmeros segredos.
Da mais pura pétala branca de um malmequer, até à negra pétala do príncipe negro (rosa), tudo tem alma. Tudo tem um aroma, um murmúrio, uma textura. Se te deitares num grande campo de flores ouvindo o seu silêncio não te sentirás jamais sozinha.
Cada partícula do ar que respiras quer ser sentida com todos os teus cinco sentido. O teu sexto sentido será essa capacidade que tens para os viveres. Cada rasgo de sol, cada sinfonia abafada, cada perfume sem dono, cada folha perdida no passeio, casa pingo de humidade, cada estrela no céu, cada grão de areia, cada onda vinda do longínquo mar, cada lágrima num rosto sem respostas, cada mão que te dão, cada ser que se cruza contigo, cada sussurro do vento, cada coisa neste mundo tem algo para te dizer.
Sabes viver? Consegues viver?
Viver é um desafio. O maior de todos os que a vida te oferece. Passas a vida a preocupar-te com coisas que não te interessam e, de repente, chegas à conclusão de que ainda não viveste nada. Ainda vais a tempo.
Vive cada dia. Vive só tu e a Natureza. Vive só tu e o teu Mundo. Vive só tu e os outros são figurantes.
Basta ouvires o teu coração.